O uso do lítio na psiquiatria e a importância da sua dosagem recorrente

O uso do lítio na psiquiatria e a importância da sua dosagem recorrente

Os sais de lítio são conhecidos há mais de um século e o tratamento moderno com lítio começou em 1949 com a descoberta das suas propriedades antimaníacas pelo australiano John Cade. Pesquisas subsequentes de monitoração do nível plasmático tornaram o tratamento seguro, e ele foi introduzido na moderna psiquiatria no final da década de 70 por dois pesquisadores dinamarqueses: Schou e Baastrup, cujos estudos revolucionaram o tratamento do transtorno bipolar demonstrarem que o carbonato de lítio reduzia de forma acentuada a incidência e a duração de episódios afetivos graves.

Atualmente o lítio é usado para tratar mania, sendo efetivo em 60 a 80% de todos os episódios de humor. É o único medicamento com propriedades estabilizadoras do humor comprovadas. O lítio não está normalmente presente no soro e não é metabolizado, no entanto, pode ser administrado na forma de sal de carbonato. Ele é usado como monoterapia ou associado a outras drogas.

Apesar da eficácia clínica estabelecida, os mecanismos específicos pelos quais o lítio exerce seus efeitos sobre o humor não são bem compreendidos. Em nível morfológico, o lítio parece preservar ou aumentar o volume das estruturas cerebrais envolvidas na regulação emocional, possivelmente refletindo seus efeitos neuroprotetores. No nível neuronal, o lítio reduz a neurotransmissão excitatória (dopamina e glutamato), mas aumenta a neurotransmissão inibitória (GABA), embora esses efeitos gerais sejam acompanhados por mudanças compensatórias complexas que se esforçam para alcançar a homeostase. Em nível intracelular e molecular, o lítio tem como alvo os segundos mensageiros, como as vias de fosfoinositol, adenosina-monofosfato cíclico e proteína quinase C, além de inibir a atividade de determinadas enzimas, como a quinase 3-glicogênio sintase (GSK-3), devido à competição com o magnésio. O mecanismo de ação proposto para a potencialização do seu efeito antidepressivo refere-se a efeitos na neurotransmissão serotoninérgica. 

A concentração sérica de lítio depende da sua ingestão diária e eliminação renal: depuração de lítio. O íon é filtrado livremente através da membrana glomerular e é reabsorvido no túbulo proximal quase na mesma extensão que o sódio e a água; somente em circunstâncias especiais algum lítio é reabsorvido no néfron distal. Sua depuração varia proporcionalmente e geralmente é 20-30% da taxa de filtração glomerular. Acredita-se que os cátions de lítio afetam os neurotransmissores do sistema nervoso central, bem como os rins e níveis excessivos podem causar uma toxicidade.

Não há dose padrão de lítio, mas a dosagem do paciente deve ser determinada individualmente com base em seus níveis séricos. A dose inicial é tipicamente entre 450 e 600 mg de carbonato de lítio por dia, onde 450 mg de carbonato de lítio correspondem a 12,2 mmol de lítio puro. As concentrações de lítio entre 0,6 e 1,2 mmol/L são consideradas terapêuticas, sendo sugerido alvos inferiores de 0,4 a 0,8 mmol/L para os idosos. E, seu nível sérico, deve ser verificado pela primeira vez após 3 a 7 dias de ingestão diária. O sangue deve ser coletado cerca de 12 h após a ingestão do último comprimido de lítio.

O tratamento utilizando este eletrólito não é isento de eventos adversos, por isso, é essencial um monitoramento regular dos seus níveis séricos, assim como um monitoramento da função renal e tireoidiana e dosagem de cálcio e de sódio antes e durante o tratamento.

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Referências:

BSCHOR, Tom. Lithium in the treatment of major depressive disorder. Drugs, v. 74, n. 8, p. 855-862, 2014.

NETTO, Ivan; PHUTANE, Vivek H. Reversible lithium neurotoxicity: review of the literature. The primary care companion for CNS disorders, v. 14, n. 1, p. 27249, 2012.

MARTINS, Nádia et al. Acompanhamento farmacoterapêutico de usuários de carbonato de lítio cadastrados no programa de saúde mental. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, v. 9, 2017.

SCHOU, Mogens; KAMPF, Dieter. Lithium and the kidneys. In: Lithium in Neuropsychiatry. CRC Press, 2013. p. 271-278.

SARMENTO, Jefferson Pereira; PROCÓPIO, José Valdilânio Virgulino; DE OLIVEIRA NÓBREGA, Rafaela. Terapia a longo prazo com lítio e o risco de danos renais: revisão integrativa da literatura. Revista de Medicina, v. 101, n. 2, 2022.

MORENO, R. A., MORENO, D. H. Lítio. Medicina NET, 2014. Disponível em: < https://www.medicinanet.com.br/conteudos/revisoes/5869/litio.htm>.

HIMMEL, Nathaniel J. et al. Chronic lithium treatment induces novel patterns of pendrin localization and expression. American Journal of Physiology-Renal Physiology, v. 315, n. 2, p. F313-F322, 2018.

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